Estranhos Atratores

COVID-19 – Turim/IT, 18 de março de 2020 – Iaci Lopes

Diário da Quarentena – Dia 9.

Por Iaci Lopes – Fotógrafa brasileira que mora há 3 anos em Turim, Itália.

Turim, 18 de março de 2020

Hoje saí finalmente para fotografar a cidade. Para sair, é necessário fazer uma autocertificação do governo dizendo qual é a motivação da saída. Sem isso, paga-se 200 euros de multa. Preenchi que sou fotógrafa e precisava fazer registros da cidade para uma mídia independente brasileira.

Quando cheguei na praça central, várias viaturas e cinco policiais me pararam questionando porque eu estava ali. Fiquei um pouco tensa e expliquei. Simpáticos e tranquilos, disseram que tudo bem, mas que eu não demorasse mais que uma hora para fazer isso e voltasse para casa em seguida. Segui as orientações e voltei com as poucas fotos que consegui fazer nesse tempo.

Por incrível que pareça, após 9 dias de confinamento e muitas regras novas a seguir, essa situação toda me pareceu normal; mas se tivessem me contado sobre ela há um mês atrás eu a acharia absurda.

A Itália tem dado um show de civilidade, empatia e organização (quem diria!). Só podemos entrar no mercado um por vez e respeitar um metro de distância um do outro na fila. Ninguém reclama. Ninguém briga. Todos respeitam, se afastam e aguardam. Os mercados estão com as prateleiras iguais a qualquer dia normal. Ninguém estoca, pois nos garantiram que os mercados não vão fechar nem faltará comida. E a gente acredita e não deixa o próximo sem mantimentos.

De vez em quando alguém canta ou coloca uma música na sacada e todos saem nas janelas para dançar um pouco e aliviar a tensão dessa situação bizarra. Estão chamando isso de abraço coletivo, mesmo com as paredes que nos separam. Também colocam o hino italiano para agradecer aos médicos que estão trabalhando dia e noite por nós, e todos aplaudem. Os números de vítimas do coronavirus ainda não baixaram, mas temos esperança. Quando um começa a perdê-la, outro lembra que isso tudo vai passar.

Tenho visto muitas pessoas nas redes sociais dizendo que aqui está um completo caos, como se a Itália estivesse a um passo de ser extinta. E eu as entendo, pois tudo isso é bem absurdo, e para entrar em pânico nesse cenário é um pulo. Mas aqui foi o primeiro lugar fora da Ásia que a doença se espalhou de forma surreal. Pelas projeções, o planeta todo passará por isso, fomos apenas os primeiros. Mas não há motivo para pânico também. Estamos nós aqui provando que é possível, sem enlouquecer.

A humanidade não será extinta por causa do vírus, mas os sistemas de saúde entrarão em colapso. Imagina uma pessoa tendo um infarto e não haver lugar para ela no hospital. A partir desse exemplo, vocês conseguem entender o que quero dizer. É necessário frear o contágio para que todas as pessoas não peguem a doença ao mesmo tempo e o mundo vire um grande caos irreversível.

Não estão pedindo para ninguém matar pessoas na guerra só para ficar um mês em casa. Ninguém vai morrer de fome em um mês. É UM MÊS, não um ano. Todo mundo que conheço já ficou um mês desempregado. E sobreviveu. Mas nossa sobrevivência vai ficar bem complicada se as pessoas continuarem transitando normalmente como se nada estivesse acontecendo por mais um mês.

E calma, galera! Isso tudo vai passar!

Mas vai passar bem mais rápido se a gente se unir e se ajudar agora.

Pra ver as fotos que Iaci tirou nesse dia, acompanhe o projeto “Dear Quarentine Diary” no Instagram @iacilopes.