Estranhos Atratores

BRUNO DEL REY E A VOZ QUE ACALMA O DHARMA – O QUE SERVE DE MOTOR, O DISCO!

Por Marcelo Mendez – Foto: Melissa Warwick

Um céu adornado de cores, calores, luzes e temperaturas escaldantes, de uma hora pra outra,  dá lugar ao vento que começa abafado para em seguida, ser fresco até se tornar um tanto gélido. A cor do dia passa para um cinza retumbante e a mosca que voava perto do meu rosto desiste de me assuntar. Os tempos mudam, a vida transitória insiste em ter pressa para que as coisas aconteçam.

Da janela do quarto onde trabalho observo tudo isso acompanhado de goles de chá de hortelã e sequilhos duvidosos. Jornalismo, por vezes, também é viver algum outro engano poético. Ou nada disso. Naquela tarde todas essas elucubrações aleatórias mudariam.

No meio das tantas pesquisas que fiz, encontrei um vídeo de uma música chamada “Dead Soul”. Um rapaz muito elegante vestido com o terno que Jean Paul Belmondo usou para sair com Jean Seberg, munido de um riso de Chris Isaak, passeava com uma elegância extrema pelo meu desktop. E quando ele abriu a boca, tudo mudou:

De repente, no meio de uma tarde de Primavera indecisa, finalmente algo muito bom começa acontecer. Uma voz me levou para as quebradas da Inglaterra em noites de Nothern Soul, sons e drinks coloridos de bares improváveis de Picadilly Circus em 1964. Seguiu me transportando para os sons da Stax em seu catalogo de vozes de encantamento pós-1969. Fritou minhas convicções melancólicas com estilingadas certeiras de Hammond Organ e outras camadas de uma Soul Music que esquentou o meu coração e meu chá de hortelã.  Eu estava conhecendo o trabalho de Bruno Del Rey e o seu “O QUE SERVE DE MOTOR” E é esse disco que vocês vão conhecer agora em Estranhos Atratores.

SOUL MUSIC PARA OS ANJOS BEBEREM GIM

Bruno Del Rey é um cara de coragem. Porquê sair de escolhas óbvias, além de talento, disposição, também demanda de uma dose enorme de coragem. Seria muito mais fácil para esse Homem de Classe, seguir por um caminho mais convencional que lhe desse uma melhor acolhida de mercado e dos hypes society’s que se tem por aí. Mas ele escolheu a grandeza musical e então temos um discasso.

“O Que Serve De Motor” é um classicão da Soul Music Brasileira desde já. Traz o fino de uma escola de produção fina que vem de lá das coisas que Tony Bizarro fez consigo próprio e com a Black Rio, passeia por beats certeiros e por uma cama sonora de extremo bom gosto. Seria fácil também dizer aqui que na garganta aberta e comoventemente entregue ao que obra pede, Bruno remete ao que tem de melhor das Black Songs dos anos 60 e 70. Vem à mente Willian Bell, nos traz de volta as reminiscências de Cassiano, Tim, a picardia vocal de Simonal, mas nesse caso tem um fato decisivo pra tudo isso dar certo. Escolhas…

Me impressiona muito o quanto Bruno acerta na escolha de seus tons, sabendo exatamente onde sua voz chega, de onde se pode tirar o máximo que ela pode dar. “There’s a Flower Blooming in My Chest” por exemplo, da uma aula disso tudo que falo. Há uma entrega emocionante do cantor aos timbres e desafios que a música pede. O resultado é uma enxurrada de emoções, de honestidade com o que se sente. Tem Cantores que cantam para agradar os anjos. Bruno canta para convence-los a tomar um gim e ouvir um Blues, isso me agrada.

“Dead Soul” o single que move o disco é uma faixa linda em que Bruno canta como se fosse dar o último beijo na boca da existência humana na terra. Um espetáculo de música, regido por um naipe de metal afiadíssimo, uma atmosfera de encanto e reflexão acerca de uma letra muito feita. O resultado final é que a Urbânia Paulista de 2023 ganha de Bruno a sua “Walk On By” contemporânea

O Que Serve de Motor é uma experiência necessária por entre esses tempos tristes. Um convite para sair das mesmices que nos acometem, das coisas óbvias que inundam as plataformas musicais. Eu sou um Jornalista e Punk velho do Abc, cheio de sereno no sangue, de tantas noites mal dormidas e bem vividas e quando surge um disco como esse, meu coração fica quentinho de alegria. Ouçam, curtam, sigam e recomendem a Obra. Eu garanto. De resto eu só agradeço: Muito Obrigado, Bruno Del Rey

Dead Soul, a Catarse:


O Que Serve de Motor, Álbum Completo