Estranhos Atratores

COVID-19 – Na terra encantada da mercadoria e dos brochas – Eduardo Kaze

Quarentena – dia 2

Por Eduardo Kaze.

 JB, a Besta, está certamente infectado. E livre, anda por aí espalhando o vírus que nega. Esfaqueado por um palito de churrasco, declarou que nenhuma gripe o derruba – nem panelas, nem a recessão, tampouco os cornos que ostenta lhe pesando na cabeça pois, como já declarou ao curral de jornalistas inaugurado diante do palácio, JB, a Besta, é imbrochável. Aglomerações de pessoas estão restritas por orientação especialista. Nada se disse de asnos, e Silas, o Malfeito, bradou aos fiéis: “meu templo é infechável”. Cordeiros baliram entusiasmados – conhecerão um dos sete cavaleiros e lhe beijarão a mão pútrida. JB, a Besta, apoia os apoiadores – daí sua imbrochisse: reis religiosos aplaudem, velhos havanentos senores abravaneis aplaudem. Ratos aplaudem. Têm o lugar garantido no topo da montanha de ouro que preparam para, do cume, admirar o deserto promovido pela vontade de sentar no pico dourado da decadência. Não se importam, contanto que não brochem – mas brocharão; já brocham.

Dia 2 (21/03/2020)

Sábado não há trabalho jornalístico remunerado e, já pela manhã, me ocupo esclarecendo as questões que, ontem, incentivado pelo isolamento conjunto ao álcool, negligenciei. Contudo, antes, um breve esclarecimento: não me empenho nesse estudo sob orientação de coaches meta-sei-lá-o-que ou gurus do empreendedorismo que, baseados num segredo qualquer, vendem a cura para todos os males e incentivam pessoas a não dormirem enquanto outros dormem. São palhaços de paletó, ao meu ver, e ponto final. Adelante.

Marx certamente dormia bem, quando não estava tossindo. Ainda que O capital, sua obra de vida toda – e além, pela caneta do fiel escudeiro Engels – certamente lhe tirasse ocasionalmente o sono. Sim, o barbudo dedicou a vida a entender porque um sistema é capaz de ser tão amado trazendo tanta miséria – e ele que o diga: perdeu filhas, foi expulso de países e só não passou fome por causa de – mais uma vez, o anjo – Engels; filho da burguesia que rompeu com os laços fraternais da boa-vida e mudou de lado e de trincheira.

O Livro 1 d´O Capital começa com A Mercadoria. E Marx justifica: “não começo nunca dos conceitos”, diz ele. “Parto da forma social mais simples em que se corporifica o produto do trabalho na sociedade atual, que é a mercadoria.

Entender a mercadoria para além do comércio é tarefa complicada. Mas, Marx acertadamente começa por ela: o que, no capitalismo, é mais comum que a mercadoria?

Antes de qualquer coisa, é necessário dizer: para ser mercadoria, uma coisa precisa, a princípio, satisfazer necessidades humanas. Aí, Marx é foda! “Tanto faz”, diz ele, se essas necessidades provêm “do estômago ou da imaginação – não altera em nada a questão”.

BOOM!

Foda-se se a mercadoria te alimenta a barriga ou o ego ou, ainda, se é destinada a pessoas ou indústrias. Essa característica, de satisfazer, faz dela a forma mais elementar da riqueza da sociedade capitalista e, por isso, ele parte daí. Tudo é mercadoria. Tudo é produzido para ser mercadoria e, se não for, não tem valor.

É aí que tudo fica complicado… Pois vamos entrar no tema mais controverso de Marx: a teoria do valor. Então vamos com calma…

Sei que comecei este diário com isso, o valor, mas, para fins de entendimento, ele fica pra amanhã. Por hora, olhem essas máscaras, os álcoois em gel, os papéis-higiênicos e toda a parafernália da sua casa – e a própria casa – e pense nelas como mercadoria. Enquanto isso, vou capinar o jardim com minha foice, martelar algumas coisas e finalizar três Castellanis restantes. Beijos, vermelhos amados.

Eduardo Kaze

Redatoria Gonzo